Das inutilidades II

  
Acordei tarde para o café e muito cedo para o almoço. Não lembro se era ontem ou anteontem, talvez fosse semana que vem. Acordei cantando aquela música, aquela música, aquela música na cabeça. Na verdade era apenas uma frase de uma música que eu não sabia muito bem qual era. Ah! Vocês sabem como é, não preciso explicar. Logo que levantei comecei a repetir a frase para não esquecer, queria procurar pela música, a frase era interessante, a música não deveria ser pior. Procurei, não achei. Insisti, quem sabe achava algo parecido, nada. Aí foi quando comecei a desconfiar que talvez fosse uma frase que eu mesmo tivesse criado. Naquele estado, entre o sono e a vigília, criei não só uma frase, mas também uma melodia, afinal no princípio era uma canção. Inclusive o timbre em que eu mesmo cantava mentalmente era familiar. Porém, essa melodia e esse timbre ficaram esquecidos.
Resolvi escrever a frase, pois por um momento achei que a tinha esquecido. Olhando-a escrita, soava bem. E, caso quisesse, colocar uma melodia não seria uma das coisas mais difíceis a se fazer. Era propícia para isso. Notei que o seu semblante era bonito, até me arrisco a dizer, alegre. Falava de coisas belas, parecia-me até um tanto iluminada, sabem aquelas coisas claras? Porém, talvez pela semântica ou pelo colóquio, julguei que não era uma das coisas mais felizes que eu poderia ter escrito, ou cantado, nesse caso. Pelo contrário, insistia em uma essência lúgubre, era, para mim, algo visivelmente sombrio, quiçá difícil de ser notado. Talvez seja até um desperdício dizer que ela é triste, mas arriscarei. Contudo que se entenda que não é como a tristeza que se vê por aí. Bem, como eu já disse, escrevi em um bloco de notas e deixei ali, ao lado. Ela viraria poema, é, daria um belo poema. Embora fosse somente uma pequenina frase poderia dar um bom poema. Após algum tempo que eu não lembro quanto, olhei novamente para a frase no papel. Poema nenhum sairia dali, muito menos daqui. Achei que na folha ela iria apodrecer. Ali ficará até agora: 
                                      
                             “Tardes coloridas entrem no tom do meu jardim.”

E eu até comecei a acreditar que era possível misturar o futuro, o presente e o passado.


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